Escritas narram histórias de liberdade: as cartas de alforrias de mulheres escravizadas (Pelotas, Rio Grande do Sul, 1850-1888)
Resumo
Na cidade de Pelotas, província do Rio Grande do Sul, 1.936 mulheres conquistaram a carta de alforria entre 1850 e 1888. Algumas delas levaram seus filhos consigo, outras viveram a realidade da separação pela condição jurídica e muitas não tiveram a experiência da maternidade em meio a transição da escravidão para a liberdade. Esta é apenas uma marca da intersecção entre gênero, raça e classe que atravessava a vida das mulheres pretas, pardas, escravizadas e libertas, das quais trato nesta pesquisa. Considerando suas particularidades, esta dissertação trata sobre os caminhos que percorreram para conquistar a liberdade para si e para os seus em uma cidade em que o índice de pessoas em condições de escravidão era bastante alto mesmo nas últimas décadas em que este sistema esteve em vigência no Império. Através da análise do perfil da mulher alforriada em Pelotas dentro deste período foi possível observar como suas características pessoais talvez tenham impactado no processo de suas libertações e, também, como o contexto influenciou nesta questão. Investigando as suas origens, por exemplo, observei que mulheres que nasceram no Brasil (crioulas) conquistaram mais manumissões, mas, em contrapartida, as africanas, sobretudo as minas, lideraram as obtidas por meio do pagamento de algum valor. Já as que eram classificadas com algum ofício e, portanto, ocupavam-se dele em seus cotidianos tinham a possibilidade de apropriar-se destes conhecimentos específicos a seu favor e dos seus. Além de ser um meio de busca por melhores condições de vida após a emancipação. Com isso quero dizer que, em todos os capítulos deste trabalho é considerado que as agências que desempenhavam no interior de uma realidade interseccional, para que pudessem obter a carta de alforria, estava dentro de suas possibilidades e realidades. Objetivando refletir sobre estas questões de forma mais aprofundada, adentro, ainda, nos vestígios deixados pelas escravizadas que “pertenceram” a três dos irmãos Azevedo e Souza – homens da elite pelotense da primeira metade do século XIX. Através deste olhar mais micro foi possível identificar os laços que constituíam e os meios que encontravam para sobreviver, e, no dia a dia do trabalho árduo, construir a possibilidade de obtenção do documento de liberdade.